Recomendações
no uso de calcário e gesso em cana-de-açúcar (1)
Mauro Sampaio Benedini, engenheiro agrônomo
RESUMO
A resposta da cultura da
cana-de-açúcar à aplicação de calcário vem sendo bastante estudada. O gesso em
menor escala. Inúmeros trabalhos de pesquisa mostram a elevada tolerância da
cana-de-açúcar aos fatores responsáveis pela acidez do solo. A
correlação da produção com os teores de cálcio no solo foi mostrada por
alguns pesquisadores.
O "Projeto
Calagem", trabalho desenvolvido por Benedini na Copersucar (Cadernos Copersucar -
Nº16); definiu nova fórmula para recomendar calcário,
níveis críticos de cálcio e magnésio no solo, possíveis respostas a maiores
doses em solos com teores de cálcio baixo em profundidade; bem como necessidade
de monitoramento de soqueiras em solos de baixa CTC.
A análise dos dados do
trabalho de Penatti, também na Copersucar,
confirma as proposições de Benedini. A resposta em
produtividade a maiores doses que as recomendadas poderão aparecer em solos com
baixos teores de cálcio no perfil. Por outro lado, solos com teores
satisfatórios de cálcio + magnésio, mesmo que com Saturação em Bases baixa ou
CTC elevada, não respondem à calagem. Portanto, a fórmula da Copersucar ( NC=(3-(Ca+Mg))x100/PRNT ) é a mais econômica e tecnicamente a mais
recomendada para definir doses de calcário para a cana-de-açúcar. Solos com
baixos teores de cálcio no perfil responderão a maiores doses independentemente
da CTC ou Saturação em Bases do solo.
Os trabalhos de pesquisa
com gesso, visando quantificar os benefícios no aprofundamento de bases no
solo, em especial o cálcio; devem isolar o efeito do enxofre como nutriente.
Quando esse efeito é isolado, as vantagens do gesso aparecem em solos com
teores extremamente baixos de cálcio no perfil, o que restringe bastante a sua
utilização. Nunca utilizá-lo isoladamente. A sua utilização em solos férteis
deve ser rigorosamente avaliada, pois pode acarretar em prejuízos na lixiviação
de outros cátions, principalmente o potássio.
1 - INTRODUÇÃO: O uso de calcário em áreas cultivadas com cana-de-açúcar é
rotineiro, principalmente após a expansão do seu cultivo para solos menos
férteis, inclusive com aplicações também em soqueiras. O gesso, em menor
escala, também vem sendo utilizado. A resposta da cultura à aplicação de
calcário vem sendo bastante estudada, porém os critérios de recomendação de
doses divergem. Com o objetivo de contribuir para um consenso e diminuir
dúvidas entre usuários, elaboramos este trabalho.
2 - RESULTADOS DA
PESQUISA COM CALCÁRIO:A pesquisa em cana-de-açúcar sobre calcário pode ser considerada extensa.
Inúmeros trabalhos foram publicados e projetos de pesquisas desenvolvidos,
especialmente pela Copersucar, a partir de 1980.
a) Trabalhos diversos:
Marinho e Albuquerque
(1981), utilizando 21 ensaios de experimentos de campo, obtiveram boa correlação
da produção relativa de cana com os teores iniciais de cálcio e magnésio do
solo ao eliminarem quatro solos com teores de alumínio trocável superior a 1,3 meq/100cm3 que, apesar de possuírem cálcio + magnésio
elevados, apresentaram respostas em produção; concluindo assim sobre os efeitos
nocivos do alumínio trocável no solo.
Porém, com os dados do
trabalho, observamos que a calibração exclusiva para o cálcio é significativa.
Percebe-se que os teores de cálcio nos solos eliminados são baixos, apesar da
soma cálcio + magnésio estar elevada devido aos altos teores de magnésio, pouco
comum. Portanto, a resposta à calagem deveu-se ao adequado suprimento de cálcio
e não, especificamente, à correção dos teores de alumínio no solo.
Esta mesma conclusão também
foi obtida por Marinho e outros (1980) em casa de vegetação ao demonstrarem que
a produção da cana, cortada aos cinco meses de idade, não foi afetada, quando
suprida adequadamente com sulfato de cálcio (gesso), mesmo com teores de até
6,7 meq/100cm3 de alumínio no solo e pH de 4,1 meq/100cm3. Outros trabalhos também demonstram a elevada
tolerância da cana-de-açúcar às condições adversas de solo.
Hetherington e outros (1986), na Austrália,
trabalhando com 34 cultivares de cana de diversas origens, em solo com teores
tóxicos de alumínio para outras culturas; concluíram que a cana-de-açúcar
possui alta tolerância ao alumínio, não apresentando nenhum sintoma visível de
toxidez nas raízes analisadas de qualquer um dos cultivares testados.
Haysom e outros 1986) trabalhando com solos ácidos e com
altos teores de alumínio trocável, observaram que a resposta à calagem só
surgia quando os teores de cálcio trocável estavam abaixo do nível crítico de
0,65 meq/100cm3, na profundidade de 0-25cm;
concluindo que a recomendação econômica para o uso de calcário deve se basear
no teor de cálcio trocável do solo até que se provem os efeitos nocivos do
alumínio.
Martin & Evans (1964),
em solução nutritiva, constataram restrição no crescimento radicular da cana
quando exposta à concentração de 50 a 500 ppm de alumínio. Resultados
semelhantes foram obtidos por Azeredo & Sarruge
(1994), também em solução nutritiva, com teores menores que 10 ppm prejudicando
alguns cultivares. Concluíram haver variação entre as variedades estudadas quanto
à tolerância ao alumínio. Porém comentam também que, quando a cana é cultivada
no campo, o alumínio não se constitui em fator limitante, pois as concentrações
de alumínio na solução dos latossolos do Brasil, quando com teores
satisfatórios de cálcio e magnésio, encontram-se normalmente em torno de 0,51
ppm; valores estes bem menores (mais de vinte vezes mais baixo) dos que
apresentaram problemas em solução.
b) O "Projeto
Calagem":
b.1 - Resultados obtidos
(níveis críticos de Ca+Mg).
Os resultados obtidos por Benedini (1988) no "Projeto Calagem" foram
publicados nos Cadernos Copersucar Nº16, com o título de "Novo conceito no uso de
calcário em cana-de-açúcar". Trabalhando com dados de 11 ensaios próprios,
instalados em usinas cooperadas e 13 da literatura; concluiu que a cultura da
cana-de-açúcar é pouco sensível aos fatores que determinam a acidez do solo
(pH, saturação em bases, saturação em alumínio e teores trocáveis de alumínio
no solo) e que os teores de cálcio + magnésio e os teores de cálcio isoladamente
no solo foram os fatores que determinaram a resposta da cana-de-açúcar ao uso
de calcário, definindo níveis críticos de 1,4 meq/100cm3
de cálcio + magnésio no solo e de 1,0 meq/100cm3 de cálcio isoladamente, suficientes para atingir 97% da
produtividade máxima esperada.
No mesmo trabalho, em
outros 18 ensaios ainda não colhidos na época, demonstra a elevada e rápida
lixiviação de bases na aplicação de doses elevadas de calcário (triplo da dose
recomendada pelo método da saturação em bases), em solos que na maioria
apresentavam baixa CTC (4 a 5 meq/100cm3). Cita que,
na dose máxima (triplo), com apenas dois meses após a aplicação do calcário, os
teores adicionais de cálcio + magnésio encontrados na segunda camada (25 a 50
cm) correspondia a 1,3 toneladas de calcário,
representando 20% da dose aplicada de 6,5 ton/ha.
Quando mostrou a lixiviação em
bases, o autor comenta que é provável que esta beneficie a cultura, nos solos
com baixos teores de cálcio + magnésio em profundidade, podendo resultar em
maiores produções que as esperadas pela correção apenas na camada arável, pois,
vários trabalhos já demonstravam os benefícios no maior e
mais profundo enraizamento das plantas com conseqüente melhor
aproveitamento de água e nutrientes, quando o solo é corrigido em seu perfil
quanto ao teor de cálcio.
b.2 - Fórmula
recomendada.
A recomendação desconsidera
o poder tampão do solo e os fatores responsáveis pela sua acidez. A elevação da
saturação em bases no solo não apresentou boa correlação com a resposta da cultura
à aplicação de calcário.
Esses resultados culminaram
na recomendação de calcário pela fórmula:
|
NC = (3-(Ca+Mg))x100/PRNT |
|
A recomendação desconsidera
o poder tampão do solo e os fatores responsáveis pela sua acidez. A elevação da
saturação em bases no solo não apresentou boa correlação com a resposta da
cultura à aplicação de calcário.
b.3 - Classes de teores
de cálcio + magnésio.
As correlações obtidas para
cálcio + magnésio e cálcio isoladamente permitiram classificar os teores no
solo, conforme a tabela abaixo:
Classes de teores de cálcio
+ magnésio e cálcio (meq/100cm3)
Classes |
Ca + Mg |
Ca |
||
meq/100cm3 |
mmolc/dm3 |
meq/100cm3 |
mmolc/dm3 |
|
Muito baixa |
< 0,28 |
<2,8 |
< 0,19 |
<1,9 |
Baixa |
0,28 a 0,60 |
2,8 a 6,0 |
0,19 a 0,43 |
1,9 a 4,3 |
Média |
0,61 a 1,41 |
6,1 a 14,1 |
0,44 a 1,00 |
4,4 a 10,0 |
Alta |
1,42 a 3,20 |
14,2 a 32,0 |
1,01 a 2,28 |
10,1 a 22,8 |
Muito alta |
> 3,20 |
>32,0 |
> 2,28 |
>22,8 |
Obs.
Os dados grafados em vermelho pertencem ao trabalho original.
Benedini recomenda também o monitoramento
dos teores de cálcio + magnésio nos solos com CTC inferior a 5-6 meq/100cm3, pois esses solos não são capazes de reter
teores satisfatórios desses cátions durante o ciclo da cultura (5 ou mais
anos).
b.4 - Ratificando os
resultados obtidos.
Como existe correlação
positiva entre V% e Ca+Mg, é necessário haver uma distribuição proporcional de
solos com diferentes Capacidades de Troca Catiônica quando estes forem
estudados, pois em solos com baixa CTC; pequenas quantidades de cálcio +
magnésio modificam significativamente a saturação em bases e nos de CTC
elevada, somente altas quantidades desses cátions modificam o V%, devido ao seu
alto poder tampão.
Partindo deste raciocínio, Benedini e Korndorfer (1992)
analisaram nove ensaios de CTCs proporcionalmente
distribuídas escolhidos de acordo com as faixas de CTC < 4,0 meq/100cm3; de 4 a 7 meq/100cm3 e
> que 7 meq/100cm3. Concluem, mais uma vez que o
Cálcio + Magnésio e Cálcio isoladamente são os parâmetros que melhor expressam
a necessidade de calcário para a cana-de-açúcar, com valores de coeficientes de
correlação para ambos os casos de 0,73. Para o Índice de Saturação em Bases e
Saturação em Alumínio os coeficientes foram respectivamente de 0,22 e 0,12,
confirmando que esses parâmetros não são satisfatórios na previsão da resposta
da cana à aplicação de calcário.
b.5 - Resumo dos dados dos
ensaios conduzidos.
A tabela 1 resume os dados
dos ensaios do "Projeto Calagem":
TABELA 1 - Resumo dos
dados do trabalho de Benedini (1988) com calcário:
Obs: Ensaios de 1 a 11: incluídos na curva
de calibração do "Projeto calagem". Ensaios 12 a 23:
lixiviação nas doses altas. Colhidos posteriormente
c) Outros trabalhos Copersucar.
Penatti (1993), objetivando estudar o gesso
e confirmar os resultados obtidos para calcário por Benedini;
trabalhou com 12 experimentos em cana planta e 7 em soqueiras, obtidos a partir
de outro grupo de ensaios. Conclui que a fórmula da Copersucar
é a mais indicada para a cana-de-açúcar, inclusive com análise econômica dos
dados.
Porém, complementa nas
recomendações que, solos com teores de cálcio menores de 0,4 meq/100cm3 quando com CTC maior que 7 meq/100cm3
devem receber 2,0 ton/ha a mais de calcário ou optar
pela fórmula da saturação em bases.
Observa-se que os solos nos quais obteve estas conclusões, possuem baixos
teores de cálcio em profundidade, enquadrando-se no caso de possíveis respostas
às aplicações de maiores doses de calcário quando o solo apresentar baixos
teores de cálcio + magnésio no perfil do solo.
Portanto, estes solos e
outros, inclusive também os de CTC baixa com baixos teores de cálcio em
profundidade; deverão apresentar respostas a maiores doses das recomendadas.
Acreditamos, portanto, que a restrição imposta deva-se basear aos teores de
cálcio no perfil do solo e não a CTC do solo.
O problema, porém, são as
interpretações confusas nessas recomendações, pois alguns técnicos consideram
que a Copersucar, através deste trabalho, passou a
recomendar a utilização do método da Saturação em Bases para solos de CTC maior
que 7 meq/100cm3, o que não foi o proposto. É necessário que o solo possua baixos teores de cálcio como
bem citado pelo autor. O autor mostra em outros casos que solos de elevada CTC,
quando com teores de cálcio + magnésio satisfatórios, apesar
da baixa saturação em bases, não apresentam respostas em vários cortes
para doses de até 6,0 ton/ha.
Gavioli e outros na Usina São Martinho onde
também não observaram efeitos do calcário e gesso em soqueiras de cana em solo
LR distrófico, com teores iniciais de cálcio +
magnésio de 2,3 meq/100cm3 e saturação em bases de
29%, concordando com os resultados obtidos.
Na análise dos dados desses
trabalhos fica claro que solos com elevada CTC que apresentam teores de cálcio
+ magnésio próximos ou acima dos definidos como críticos por Benedini, não respondem em produtividade, em vários cortes
(Usina São Manuel), mesmo com saturação em bases baixas (20%). Aqueles com
respostas deveram-se claramente à lixiviação de bases, devido aos teores de
cálcio baixos em profundidade, apesar de satisfatórios em superfície (Usina São
Luiz). A curva obtida para Cálcio + Magnésio, juntando-se aos dados de Benedini (1988), permanece praticamente a mesma.
Os trabalhos na Usina São
Manuel (Latossolo Roxo textura argilosa distrófico e
Latossolo Vermelho Amarelo textura muito arenosa) merecem comentários
especiais. Vários ensaios foram instalados tais como calcário e gesso antes do
plantio; calcário antes e gesso após primeiro corte e finalmente calcário e
gesso após primeiro corte. No Latossolo roxo, apesar da saturação em bases ser baixa (20%), nenhum dos ensaios instalados responderam ao
calcário e ao gesso, mesmo após os quatro cortes. Pela análise dos dados percebe-se teores satisfatórios de cálcio no perfil do solo,
até um metro de profundidade, próximos a 1,0 emg/100cm3,
sendo, portanto coerente a não resposta. Já no LVA, respostas surgiram,
principalmente na análise conjunta dos quatro cortes. Analisando os dados,
percebe-se o aprofundamento de bases, aumentando os teores de cálcio nas
camadas de 50 a 100cm, que eram muito baixos (0,15 para 0,30 meq/100cm3), também concordando com os comentários
anteriores.
Os efeitos do calcário e do
gesso foram positivos e independentes, ou seja, cada um dos produtos apresentou
individualmente respostas em produção. Sabe-se que o principal benefício do
gesso é o fornecimento de cálcio e que ele não corrige a acidez do solo. Não
era de se esperar retorno satisfatório isoladamente se a cana tivesse
sensibilidade à acidez, o que provavelmente não aconteceria se a cultura
estudada fosse sensível à acidez.
Na tabela 2 temos um resumo
dos resultados dos ensaios conduzidos por Penatti.
TABELA 2 - Resumo dos dados
dos ensaios de Penatti
3 - CONSIDERAÇÕES
GERAIS: Até que
novas pesquisas sejam realizadas e novos dados sejam obtidos, o Método Copersucar de recomendação de calcário é o mais indicado
para prever a resposta da cultura da cana à aplicação de calcário. Porém, solos
com teores insatisfatórios de cálcio no perfil, tanto de CTC baixa quanto elevada,
apresentam respostas em produção a maiores doses de calcário das recomendadas,
única e exclusivamente devido à lixiviação de bases, em especial o cálcio.
Nesses casos, o Método Copersucar recomenda pouco
calcário nos solos de CTC elevada e o da Saturação em Bases recomenda pouco
para solos de baixa CTC.
Solos conhecidos como
"Sangue de Tatu", de elevada CTC, fazem parte desse raciocínio.
Inúmeros outros solos fracos e arenosos de baixa CTC também. Porém, uma grande
maioria dos solos de CTC elevada não responderá à calagem mesmo com saturação
em bases baixa ou presença de alumínio no solo, devido, como já citado, aos
teores satisfatórios de bases.
Após todas essas
colocações, com inúmeras comprovações de dados de pesquisa, o método da
Saturação em Bases não deve ser recomendado para a cultura da cana-de-açúcar.
Este método recomenda, comparativamente, pequenas doses para solos de CTC baixa
e doses exageradas e antieconômicas para solos de
alta CTC.
Fique bem claro que o
objetivo de todas estas considerações certamente não é o de criticar o método
da Saturação em Bases, método este consagrado pelo Instituto Agronômico de
Campinas e amplamente divulgado e recomendado. Sem dúvida nenhuma ele deve ser utilizado para a maioria das culturas que são sensíveis a variação
do pH do solo (poder tampão) e também sensíveis aos níveis de alumínio
tóxico.
4 - PESQUISAS COM
GESSO: O uso de
gesso como fornecedor de enxofre para as culturas possui resultados
consistentes no aumento da produtividade e vem sendo bastante estudado. Por
outro lado, trabalhos desenvolvidos no Brasil Central, em solos de cerrado,
mostraram também efeitos importantes do gesso no aprofundamento radicular das
plantas de milho, propiciando maior absorção de água e nutrientes das camadas
mais profundas do solo. A partir desses resultados, o gesso passou a ser mais
estudado.
É consenso geral que o
gesso não substitui o calcário na elevação do pH do solo. A
maior solubilidade e mobilidade do cálcio existente no gesso torna-o
vantajoso em solos deficientes no elemento em profundidade. A neutralidade de
parte de suas cargas propicia ao gesso maior lixiviação e com maior rapidez,
atingindo camadas mais profundas em menor espaço de tempo.
Alcarde cita que o gesso comporta-se de maneira
semelhante a qualquer outro fertilizante constituído de cátions e ânions como
KCl, K2SO4 e Ca(NO3)
2. A diminuição da atividade de outros cátions, em especial o alumínio,
não é privilégio do gesso. Todo fertilizante que apresenta cátions e ânions e é
decomposto quando aplicado ao solo, age dessa maneira. A particularidade do
gesso é poder ser utilizado em quantidades superiores a dos demais adubos
devido ao seu baixo custo.
Quando o objetivo principal
é testar esses benefícios no aprofundamento de bases pela aplicação do gesso,
alguns trabalhos ficam prejudicados por não isolarem o efeito nutricional do
enxofre. Sabe-se também dos efeitos negativos do gesso quanto à lixiviação de
outras bases trocáveis causando, em alguns casos, o empobrecimento do solo.
O baixo custo do nutriente
cálcio contido no gesso é fator favorável à sua utilização. O calcário, no caso
da cana-de-açúcar, muitas vezes apresenta teores elevados de magnésio que
participa na reatividade do material, fazendo parte do cálculo do PRNT (Poder
Relativo de Neutralização Total). O gesso, nesses casos, entraria como um balanceador da relação Ca/Mg do
solo, principalmente quando o calcário utilizado for o dolomítico que possui
esta relação exagerada (1/1 em meq/100cm3).
Trabalho não publicado de Benedini na Usina Bonfim, com
doses crescentes de gesso (até 4,0 ton/ha) na
presença e ausência de calcário, objetivando testar seus efeitos no solo e no
aumento da produtividade de cana; mostrou não haver aumento de produção,
provavelmente devido aos teores satisfatórios de cálcio no perfil (até 80 cm),
próximos a 1,0 meq/100cm3. O fornecimento de enxofre
a todos os tratamentos impediu qualquer resposta a este nutriente. Porém, a
aplicação isolada de gesso, causou acentuado empobrecimento de bases no perfil
do solo até 80 cm, em especial o potássio, que praticamente foi eliminado do
perfil. A lixiviação do magnésio e do potássio, quando na presença de calcário,
foi menor mas também preocupante, mesmo na menor dose de 1,0 ton./ha. Outros autores citam efeitos semelhantes do gesso.
Possivelmente esta rápida
perda de bases no perfil ocorreu devido às suas características químicas de pH
pouco ácido e teores insignificantes de alumínio no perfil analisado. Sabe-se
que a retenção do SO4-- pelo solo ocorre de maneira semelhante ao fósforo, só
que em menor intensidade, portanto é mais acentuada em solos mais ácidos. A
presença de alumínio seria importante para a formação de AlSO4+
e outras formas complexas, liberando o cálcio para a solução. Se não existir
alumínio, a lixiviação ocorre com maior intensidade.
É importante citar que o
teor de argila do solo onde foi instalado o ensaio é de 65%, o que teoricamente
dificultaria a lixiviação do gesso, fato não confirmado pois, após um ano e
meio da aplicação, o gesso aplicado praticamente não foi encontrado no perfil,
nas diferentes doses aplicadas. A precipitação pluviométrica no período foi de
aproximadamente 1.500 mm, considerada normal.
Comparando calcário e gesso, Quaggio e outros (1982) cita que a movimentação em pulso
caracteriza a lixiviação de bases provocada pelo gesso e a distingue da que
ocorre com calcário, que além de ser mais lenta, é constante e gradual.
Trabalho, conduzido em casa
de vegetação por Dal Bó e
outros (1986) não mostrou efeitos benéficos da lixiviação de bases provocada
pelo gesso na produção de massa verde, mesmo com teores de 0,40 meq/100cm3 de cálcio em profundidade, teores considerados
baixos.
Trabalho não publicado na Copersucar, em solo extremamente pobre em cálcio até um
metro de profundidade (0,1 meq/100cm3) constatou-se
um maior desenvolvimento radicular da cana no perfil do solo no tratamento com
calcário mais gesso (2,0 + 2,0 ton/ha) comparado ao
com apenas calcário (4,0 ton/ha). As diferenças em
produção surgiram apenas no quarto corte. Ambos os tratamentos foram bastante
superiores à testemunha, apenas adubada.
Ritchey e outros (1983), trabalhando com
soja em casa de vegetação, constataram severas restrições ao crescimento das
raízes apenas quando os teores de cálcio se situavam abaixo de 0,02 a 0,05 meq/100cm3 e que teores de 0,2 meq/100cm3
de cálcio no solo, em ausência de alumínio, foram suficientes para o bom
desenvolvimento radicular da cultura.
Resumidamente, as
conclusões obtidas por Penatti (1994), são: Nos
inúmeros ensaios conduzidos, não encontrou problemas com lixiviação de
potássio; apesar de seus teores nos solos já serem baixos na maioria dos
ensaios. Comenta as boas respostas em produtividade da cultura à aplicação do
gesso, sendo estas, porém, mais modestas das encontradas por Morelli e outros (1992), possivelmente pelo fornecimento de
enxofre (60 kg/ha) em todos os tratamentos dos ensaios. Cita que doses maiores que 5,0 ton/ha poderão
prejudicar a cultura e que em cana soca o gesso tem efeito mais
pronunciado que o calcário. Finalmente cita que as doses de gesso devem
basear-se nas análises químicas da segunda camada do solo e que em solo
argiloso deve-se aplicar até 3,0 ton/ha e arenoso até
2,0 ton/ha. A interação de calcário e gesso
apresentou excelentes resultados e se completam, além de reduzir os custos da
aplicação.
5 - RECOMENDAÇÕES: Após as considerações apresentadas
e com base nas análises de trabalhos realizados pela pesquisa, recomendamos:
O método Copersucar, NC = (3-(Ca+Mg))x100/PRNT,
é o mais indicado para a recomendação de doses de calcário para a
cana-de-açúcar.
Solos com baixos teores de
cálcio no perfil do solo (menores que 0,43 meq/100cm3
até um metro de profundidade), teores considerados baixos pela curva de
calibração; deverão responder a maiores doses das recomendadas, sendo que a
interação de doses de calcário com gesso (no mínimo 2/1) deverão apresentar os
maiores retornos. Quanto menores forem os valores de cálcio no perfil do solo,
maiores serão as possibilidades de respostas a maiores doses de calcário que as
recomendadas.
Casos extremos de baixa fertilidade no perfil (teores menores que 0,20 meq/100cm3 de cálcio) poderão responder economicamente,
possivelmente até ao dobro da dose recomendada de calcário associada a doses
pela metade de gesso.
Essas doses elevadas dos
produtos (5-6 ton/ha de calcário e 2,5-3,0 ton/ha de gesso), somente serão viáveis nesses casos
extremos de solos muito pobres em cálcio em todo o perfil (até um metro),
abaixo dos teores considerados muito baixo da tabela. A aplicação de gesso visando
a lixiviação de bases fica limitada apenas a solos com
baixos teores de cálcio em profundidade (menores que 0,4 meq/100cm3),
o que restringe bastante a sua aplicação e que na maioria são solos arenosos e
de baixa CTC. A exceção são os popularmente conhecidos por "sangue de
tatu" que podem também ser de CTC elevada e argilosos.
Não substituir, nem
parcialmente, as doses recomendadas de calcário por gesso. Apenas complementar
quando necessário. Nunca aplicá-lo isoladamente, a não ser em pequenas doses.
Para o fornecimento exclusivo de enxofre, pequenas doses de gesso são
suficientes (100 a 300 kg/ha) e deve ser recomendado para solos deficientes.
Aplicação de calcário e/ou gesso em solos com teores satisfatórios de cálcio +
magnésio no perfil do solo é desnecessária e certamente antieconômica,
independentemente dos fatores responsáveis pela acidez do solo; além de poder
ser perigosa no caso do gesso. A opção na aplicação de calcário em solos com
teores satisfatórios de cálcio, mesmo sabendo-se da provável não resposta
(rotação de culturas, por exemplo), deve ao menos ser isolada; eliminando o
gesso, haja vista os maiores riscos deste produto.
Solos podzolizados
(situação pouco estudada pela pesquisa), com teores satisfatórios de cálcio em
profundidade; possivelmente responderão menos à aplicação de calcário e gesso.
Soqueiras de cana-de-açúcar
instaladas em solos de baixa CTC, menores que 4-5 meq/100cm3,
não são capazes de manter níveis satisfatórios de bases durante o ciclo;
devendo ser monitoradas e receber calcário associado ou não com gesso, se
necessário, após alguns cortes. Inclui-se nesses casos também os solos
"sangue de tatu" que apesar de em alguns casos, apresentarem elevada
CTC, também apresentam lixiviação exagerada de bases. Os
níveis críticos definidos para cana planta podem ser seguidos também
para as soqueiras. O gesso, pelas suas características, apresenta excelentes
resultados nas aplicações juntamente com o calcário, em soqueiras carentes, de
baixa fertilidade.
Esses conceitos e recomendações
se modificarão se surgirem, no futuro, variedades sensíveis à acidez do solo.
6 -
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Sabe-se que essas colocações não podem ser consideradas como definitivas mas
espera-se que auxiliem os produtores e profissionais de usinas e destilarias a
decidirem sobre as melhores doses de calcário e gesso a serem aplicadas,
obtendo maiores produtividade com menores custos. Calcário, principalmente, e
gesso são sem dúvida, ferramentas imprescindíveis para a obtenção de maiores
produtividade e também maior longevidade dos canaviais.
(1)- Publicado
originalmente no CanaWeb/JornalCana- Junho de 2002.
7- LITERATURA
CITADA:
AZEREDO, D.F. de & SARRUGE, J.R. Alumínio na produção de matéria
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spp). Saccharum APC, São
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BENEDINI, M.S. Novo conceito no uso de calcário em cana-de-açúcar.
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Mauro Sampaio Benedini, engenheiro agrônomo
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