CORRETIVOS DE SOLOS - Parte 2

 

MANEJO DOS CORRETIVOS PARA NEUTRALIZAÇÃO DOS SOLOS

 

1. Caracterização dos produtos

 

Os produtos utilizados como corretivos de solos podem ser encontrados ocorrendo naturalmente em jazidas de rochas calcárias (sedimentares ou metamórficas) ou obtidos a partir de processamentos industriais (produtos derivados de rochas calcárias e de resíduos industriais). São materiais que apresentam como constituintes neutralizantes ou como princípios ativos os carbonatos, óxidos, hidróxidos, silicatos.

As rochas calcárias são encontradas com relativa abundância, ocorrendo em grandes jazidas e abrangentemente distribuídas pelos territórios. Moídas, essas rochas dão origem ao próprio corretivo, que é aplicado nos terrenos agricultáveis, com a finalidade de neutralizar a sua acidez. Outros agentes neutralizantes também podem ser encontrados em outros derivados de rochas calcárias industrializadas tais como: cal virgem, cal hidratada e do calcário calcinado. Ainda na linha dos neutralizantes de acidez resultantes de processos industriais, estes produzidos como resíduo em indústrias siderúrgicas, podemos citar os silicatos de cálcio e magnésio (a escória de siderurgia), cujo agente neutralizador da acidez do solo são os íons silicato  Calcar15a{Alcarde(1986a)}.

Outro produto utilizado na agricultura e resultante de processos industriais é o gesso. Ele é produzido como decorrência da fabricação de fertilizantes fosfatados de alta concentração como o superfosfato triplo, MAP e DAP. Esta é a principal fonte de gesso para o uso agrícola. Não obstante, este material também pode ser encontrado na natureza sob forma de jazidas. Neste caso, tem sido utilizado mais intensamente em outras áreas da economia, mais especificamente na área de construção civil.

A utilização do calcário na preparação do solo para o seu uso agrícola é uma prática consagrada. Por outro lado, a utilização do gesso, isoladamente ou em mistura com calcário, carece de informações mais conclusivas para tornar-se uma prática de uso agrícola mais generalizada. Entretanto, a diversidade de condições encontradas no ambiente e os comportamentos erráticos de resposta das culturas ao gesso mostram a existência de condições específicas, onde a utilização destes produtos pode promover ganhos satisfatórios de produtividade nas culturas em que são utilizados Calcar10a{Morelli(1992a)}.

Um fato incontestável é que quaisquer destes produtos devem ter a sua utilização respaldada por uma contínua prática de experimentação agrícola. Esta prática é uma importante atividade geradora de informações locais, que confere segurança, consistência e suporte para as tomadas de decisão. O acesso a informações consistentes para a indicação de uso destes produtos, tendo como sustentação resultados experimentais confiáveis, possibilita a realização de recomendações que garantam ganhos de produtividade e favoreçam a melhoria da qualidade da matéria-prima produzida.

 

2. Ação do Calcário

 

A ação de neutralização da acidez do solo dá-se através de bases químicas, utilizando-se como veículo produtos definidos como corretivos. O calcário e seus derivados são as principais fontes destas bases químicas. Elas são obtidas na natureza através do processamento de rochas calcárias.  Essas bases químicas são parte da composição de cada um destes materiais e atuam reagindo com o hidrogênio encontrado livre na solução do solo. Os produtos finais destas reações são moléculas de água e gás carbônico.   

A hidrólise do calcário resulta nos íons cálcio (Ca+2) e magnésio (Mg+2) e carbonato (CO3-2). O íon carbonato é a parte responsável pela neutralização da acidez do solo. O cálcio e o magnésio permanecem na solução do solo, podendo ser capturados pelas raízes em crescimento ou serem adsorvidos pelo complexo de trocas do solo. Nas reações de neutralização os carbonatos reagem primeiramente com os íons hidrogênio (H+) da solução do solo, formando o ácido carbônico (H2CO3). A hidrólise do ácido carbônico produzirá como  resultado dessa reação água e gás carbônico (CO2) FontCorFer15a{Borkert(1987a)} e {Alcarde(1986a)}.

Os óxidos (de cálcio (CaO) ou magnésio (MgO)) atuam da mesma forma que os carbonatos, porém reagem de forma mais rápida e intensa ao serem colocados em contato com a solução do solo. Nessa reação formam hidróxidos de cálcio (Ca(OH)2) e hidróxido de magnésio (Mg(OH)2), liberando uma base forte (OH-). Elas atuam sobre a acidez do solo e promovem a sua neutralização. Ao reagirem com o hidrogênio livre da solução do solo, estas bases promovem a formação apenas de moléculas de água.

A velocidade de reação dos carbonatos é mais lenta e menos intensa ao longo do tempo. O mesmo não acontece com os óxidos e hidróxidos. Suas reações mais rápidas e intensas, deixam como resultado a liberação de grande quantidade de calor. Em virtude desta liberação de energia, estas reações podem perturbar a vida microbiana do solo, e eventualmente inibir as atividades de alguns microorganismos. Isto pode ocorrer em razão de uma possível esterilização temporária da porção do solo submetida à aplicação dos produtos com estas características cáusticas {Alcarde(1986a)}.

 

2.1. Efeitos Benéficos Resultantes do Uso de Calcário

 

A aplicação de calcário é uma das práticas mais difundidas para a correção da acidez dos solos agricultáveis. A correção desta acidez da solução do solo (expressa pelo pH) é importante, porque ela interfere diretamente sobre a disponibilidade dos elementos químicos que nele ocorrem. Desta forma, o pH tem uma atuação indireta sobre as plantas, uma vez que ele atua como um fator limitante para o acesso das plantas, aos nutrientes existentes no terreno. Submetidas a estas limitações, as plantas deixam de responder aos nutrientes a elas oferecidos na forma de fertilizantes.

O uso da calagem, ao corrigir a acidez do solo, traz como conseqüência um conjunto de profundas alterações no comportamento do complexo de trocas do solo. Estas alterações observadas no meio, possibilitam criar ali um conjunto significativo de efeitos benéficos para a agricultura Calcar07a{Alcarde(1984a)}, os quais estão listados a seguir:

S        Intensificação da exploração do solo pelo sistema radicular das plantas como conseqüência da redução do teor de alumínio em um maior volume de solo;

S        Aumento do poder competitivo das espécies cultivadas em relação às plantas daninhas, que em sua grande maioria apresentam bom desempenho em solos com maior nível de acidez;

S        Manutenção de níveis mais elevados de fósforo no solo ao evitar que os fosfatos aplicados na forma de fertilizantes sejam precipitados na forma de sais insolúveis;

S        Como conseqüência aumenta a disponibilidade de fósforo no solo e facilita a absorção do elemento por parte dos vegetais;

S        Redução da ação tóxica provocada por determinados elementos encontrados no solo (ferro, manganês e alumínio), uma vez que em meios ácidos eles permanecem livres na solução do solo;

S        Estímulo das atividades microbiológicas responsáveis pela nitrificação dos sais de amônia e pela fixação do nitrogênio existente na atmosfera;

S        Potencialização da ação dos fertilizantes, que sem a prévia correção do pH do solo apresentariam resultados inferiores aos esperados e desejados; 

S        Melhoria do meio para a atuação e desenvolvimento de microrganismos responsáveis pela decomposição dos diferentes materiais orgânicos, transformando-os em matéria orgânica e humos.

S        Influencia positivamente a mineralização do nitrogênio no solo, promovendo maior disponibilidade do elemento para as plantas Calcar09a{Silva(1994a)}  

Outros benefícios decorrentes da correção do solo, podem ser observados nas mudanças pela ação direta da calagem sobre as propriedades de determinados compostos do solo. Além disso, a calagem também libera grandes quantidades dos nutrientes cálcio e magnésio para a solução do solo. Estas reações com atuação direta sobre compostos do solo propiciam:

S        A elevação da saturação de bases, em razão da liberação de cargas em compostos dependentes do pH da solução; e

S        A melhoria da estruturação física do solo do solo formando agregados bastante estáveis, sendo o cálcio um dos cátions importantes nesta ligação argila - matéria orgânica.

 

2.2. Critérios para Recomendação e Aplicação de Calcário

 

A agricultura brasileira é praticada, em sua grande maioria em solos ácidos. Tais solos são caracterizados pelas baixas concentrações de cálcio e de magnésio, pelos altos teores de alumínio, elemento diretamente envolvido com o desenvolvimento das raízes e com grande responsabilidade pela baixa disponibilidade de fósforo do solo.

Recomendar calagem pressupõe estar sintonizado com as características dos locais, onde será realizado o plantio e com procedimentos técnicos atualizados (tipos de solos, critérios para amostragem de solos, tipos de cultivo, cultura a ser plantada, etc.) de forma que  as condições dos solos, sejam ajustadas para padrões que atendam as necessidades da cultura a ser plantada. Para que os resultados sejam satisfatórios é importante associar essas informações aos conhecimentos tecnológicos disponíveis, obtidos através de pesquisas desenvolvidas na região, sejam elas próprias, institucionais ou da própria experiência acumulada pelos agricultores da região.

O clima também precisa ser considerado na avaliação da resposta das culturas à calagem. As limitações decorrentes das deficiências hídricas precisam ser consideras nas avaliações dos efeitos da calagem. Sob condições restritivas de umidade, as produtividades observadas nos locais utilizados para os testes ou para o uso comercial dos corretivos podem ser afetadas e tornar sem validade avaliações dos efeitos dos produtos testados ou aplicados com a finalidade de condicionar o solo para o plantio Calcar21a{Azeredo(1996a)}.

As recomendações para a calagem, de um modo geral, propõem que os corretivos sejam  incorporados a uma profundidade de até 20 cm apenas. No entanto, é mais aconselhável que a incorporação do calcário se dê em uma profundidade maior. A correção da acidez até a camada de 30 cm, permite às raízes explorarem maior volume de terra, aproveitando melhor a água e os nutrientes ali disponibilizados. Para que a calagem se torne efetiva e proporcione bons resultados, é necessário que o corretivo seja bem incorporado no terreno, proporcionando assim, um bom contato do mesmo com a maioria das partículas do solo.

A definição das necessidades de calagem deve estar baseada em análises de solos, realizadas em amostras de solos coletadas criteriosamente, para que o corretivo seja aplicado nos locais onde ele é realmente necessário e nas quantidades adequadas para atender a demanda da cultura a ser plantada. Embora os sistemas ou métodos utilizados para recomendação {MÉTODOS PARA A CORREÇÃO DA ACIDEZ} considerem a calagem total, aplicando-a numa dose única, algumas instituições recomendam limites máximos de dosagens para cada condição de solo e tipo de cultura. Contudo, o efeito da quantidade aplicada merece atenção. Em espécies muito sensíveis ao alumínio, a recomendação deve ter como referência a eliminação do mesmo no perfil explorado pela cultura. Em estudo conduzido com a cultura do milho, tendo como finalidade verificar a interação entre o uso calcário e a disponibilização de fósforo, verificou-se que o alumínio foi totalmente eliminado quando a quantidade de calcário aplicada por hectare foi a mais elevada (9,0t/ha) Calcar08a{Ernani(2000a)}. Mesmo que o efeito seja interessante, é importante considerar e avaliar as quantidades a serem aplicadas, tendo como objetivo minimizar os riscos que um excesso de calagem pode trazer.

Os sistemas de recomendação consideram a calagem total, sendo aplicada de uma só vez, para um período de quatro a cinco anos, dependendo de fatores como o manejo de solo, culturas, erosão e outros. Após esse período, recomenda-se realizar nova análise de solo para a quantificação de uma nova dose.

Contudo, quando as quantidades forem muito elevadas (acima de 6,0t/ha), é prudente que a aplicação do corretivo  seja realizada de forma parcelada, evitando assim, perdas do produto e alterações indesejáveis nas condições do solo. Caso o parcelamento da calagem seja realmente uma necessidade, o corretivo deve ser aplicado anualmente, considerando o período de atuação acima citado (intervalo de 4 a 6 anos). Assim, aplicam-se quantidades menores, procurando sempre completar a quantidade total recomendada Calcar12a{Embrapa(1999a)}. Dessa forma, os riscos de uma calagem superestimada são minimizados. O parcelamento não agrega ganhos econômicos para a aplicação de calcário, mas ao assegurar que a planta cultivada neste solo não sofrerá com nenhum tipo de desordem nutricional (insolubilização de micronutrientes, disputa pelas cargas coloidais entre os cátions, competição na absorção  entre magnésio e potássio, etc.), pode melhorar a lucratividade, na medida em que se procura oferecer as melhores condições para a espécie ali cultivada.

O calcário é disponibilizado no mercado com ampla variação em sua granulometria e nos teores de carbonatos (de cálcio e de magnésio). A granulometria tem a propriedade de interferir no poder de neutralização dos corretivos e constitui-se num fator importante para a valorização do PRNT. Desta forma, ela tem um peso importante na definição das quantidades de corretivos, na medida em que ela interfere diretamente na capacidade reativa do produto, quando colocado em contato com as partículas do solo. Assim produtos com granulometria muito fina podem reagir muito rapidamente com as partículas dos solos, esgotando rapidamente a sua atuação no controle da acidez. Em contrapartida, quando a moagem não é adequada e a granulometria é muito grosseira a sua capacidade de reação é reduzida em razão da dificuldade de contato dos grãos com as áreas reativas das partículas do solo. O conteúdo de carbonatos define a quantidade de agente neutralizante contido no produto e determina a sua capacidade de interferir nas reações do solo. Juntos a granulometria e o conteúdo de neutralizantes (teor de óxidos) definem o PRNT do produto. Este por sua vez, confere a capacidade de ação do produto no meio em que é aplicado e não considerá-la pode tornar o seu resultado pouco eficiente ou levar o técnico responsável a utilizar mais ou menos produto corretivo do que o necessário.

 A distribuição do corretivo deve ser processada com uniformidade sobre a superfície do terreno. A operação deve ser realizada com antecedência suficiente (mínimo de trinta dias) para que as reações do produto com as partículas do solo aconteçam de maneira satisfatória. Contudo, é recomendável a aplicação do corretivo mesmo que seja próximo do plantio, a deixar de fazê-la quando for evidente a necessidade da prática da calagem. A incorporação do produto em profundidade é a garantia de criar um ambiente mais adequado para o crescimento das raízes. Para tanto, recomenda-se que o preparo de solo seja realizado após a aplicação do calcário para que se tenha a garantia de uma boa incorporação.

A calagem é uma prática muito poderosa quando se refere ao aumento de rendimento das culturas. Entretanto, a obtenção dos melhores resultados fica condicionada a outras práticas agrícolas (adubação, controle de pragas, doenças e plantas daninhas, etc), que se não adotadas, podem impedir que a calagem se manifeste de forma integral, conforme a potencialidade de cada uma das espécies cultivadas.

 

3. Ação do Gesso

 

O gesso não é qualificado como um produto corretivo da acidez do solo. Sua inclusão neste tópico está relacionada com a remoção do Al+3 no perfil do solo, especialmente nos horizontes subsuperficiais, onde a presença do alumínio pode ser perniciosa para o desenvolvimento das raízes. Além dessa atuação direta sobre o complexo de trocas o gesso também fornece a custos muito baixos quantidades significativas de cálcio (Ca+2) e enxofre (SO4-2). A sua solubilidade é relativamente baixa, porém o suficiente para que os seus efeitos no solo manifestem-se em um prazo relativamente curto. Daí a sua ação benéfica nos horizontes subsuperficiais dos solos onde o produto é aplicado. Ainda que sua solubilidade, quando comparada à dos carbonatos de cálcio e de magnésio, seja significativamente elevada e sua ação no solo possa alterar significativamente determinadas condições do solo, o gesso não é caracterizado como um produto corretivo de solo. A sua ação na redução da acidez do meio é praticamente nula e a atividade básica (SO4-2) extremamente baixa {Borkert(1987a)}. Quando hidrolisado na solução do solo, o gesso apresenta como resultantes os íons cálcio (Ca+2) e sulfato (SO4-2).

O cátion  cálcio (Ca+2) irá  ocupar parte dos sítios de troca das cargas permanentes do complexo de troca. Contudo, grande parte do cálcio permanecerá livre na solução em sua forma iônica (Ca+2) e poderá deslocar-se para horizontes mais profundos e perder-se. Quando acontece o aumento de sua quantidade, haverá uma conseqüente alteração de sua saturação na solução e ele poderá ser lavado. Este mesmo comportamento também poderá levar outros íons absorvidos ao complexo de troca a seguirem o mesmo caminho, juntamente com o próprio cálcio, ficando sujeitos à lixiviação, por se encontrarem livres e em excesso na solução do solo.

Ao formarem associações com o ânion sulfato (SO4-2), esses cátions dão origem a compostos solúveis com menor valência ou de carga neutra. Nesta forma, eles apresentam maior solubilidade e são mais facilmente lixiviados no perfil do solo. Esse efeito tem maior intensidade sobre o cálcio, pelo fato de encontrar-se em maior quantidade na solução. A sua movimentação no perfil do solo é uma das maiores vantagens atribuídas ao uso do gesso. Uma evidência deste comportamento pode ser constatada em estudos conduzidos em casa de vegetação, utilizando-se o algodão como cultura referência, e as relações entre o sulfato de cálcio e carbonato de cálcio, no qual observou-se uma acentuada movimentação de cálcio e sulfato em profundidade Calcar06a{Silva(1998a)}.

Esta movimentação em profundidade melhora as condições químicas dos horizontes mais profundos, permitindo um maior desenvolvimento radicular e consequentemente maior absorção de água e nutrientes. Entretanto, como esta lixiviação ocorre de forma indiscriminada, o uso de gesso pode, ao mesmo tempo trazer benefícios consideráveis para as culturas, e também poderá promover a lavagem do compostos importantes para a nutrição das plantas.

Esta ação negativa do sulfato foi observada em trabalhos conduzidos para avaliar a ação do gesso sobre a produtividade de cana-de-açúcar. Quando aplicado isoladamente, o gesso causou acentuado empobrecimento de bases no perfil do solo até 80 cm, afetando especialmente o potássio, que praticamente foi eliminado do perfil. A lixiviação do magnésio e do potássio, quando o gesso foi aplicado juntamente com o calcário, foi menor, mas manteve-se um nível pouco aconselhável, mesmo na menor dose aplicada (1,0 ton. gesso/ha) Calcar01a{Benedini(2000a)}.

Além desta ação de movimentação de cátions no solo, o gesso pode apresentar outros efeitos adicionais positivos. Em solos que apresentam acidez potencial baixa e reduzidos teores de alumínio (Al+3), a melhoria do pH da solução, pode resultar da reação de troca do sulfato (SO4+2) pela hidroxila (OH-) das superfícies dos compostos de ferro e alumínio. Ao reagir com os óxidos de alumínio os ânions sulfato (SO42-)  promovem a redução do nível de toxicidade de alumínio pela indução da polimerização de alumínio através da formação de associações iônicas (AlSO4+). Isto é importante porque diminuiu a atividade do íon (Al3+) na solução do solo e do alumínio trocável de parte dos compostos que poderiam liberá-lo para a solução. Esta diminuição da atividade do íon (Al3+) na solução do solo devido à formação de (AlSO4+) é importante. Sendo o (Al3+) é a espécie mais tóxica, e o  composto (AlSO4+) absorvido com menor intensidade pelas raízes, as plantas ficam livres da interferência negativa do alumínio sobre op metabolismo da planta {Borkert(1987a)}.

A interferência sobre o comportamento de outros cátions, assim como a diminuição da atividade do alumínio em especial, não é uma qualidade reservada apenas ao gesso. Todo fertilizante que apresenta cátions e ânions em sua composição, quando decomposto no solo age dessa mesma maneira. A particularidade do gesso e, daí a sua vantagem, é poder ser utilizado em quantidades sensivelmente superiores às dos demais adubos devido ao seu baixo custo de aquisição e aplicação {Calcar14a{Alcarde(1988a)}.

 

 

3.1. Efeitos Benéficos Resultantes do Uso de Gesso

 

Quando as necessidades são evidentes, a aplicação criteriosa do gesso pode constituir-se em uma fonte de suprimento de cálcio e enxofre, além de reduzir a saturação e ação tóxica do alumínio (Al+3). Do ponto de vista agronômico, o emprego do gesso justifica-se exatamente por estes dois motivos:

a)      proporcionar o fornecimento de cálcio e de enxofre em locais onde eles são prioritários e,

b)      diminuir as concentrações tóxicas do alumínio trocável e aumentar cálcio nas camadas subsuperficiais. Esta é a situação da grande maioria dos solos sob vegetação de cerrado no Brasil Central. Neste caso, o gesso é aplicado para aumentar o teor de cálcio na solução do solo no horizonte subsuperficial, complexar parte do alumínio trocável em profundidade, além de suprir as plantas com cálcio e enxofre na camada arável, tendo como objetivo adequar o ambiente para um crescimento radicular mais intenso {Borkert(1987a)}.

 

No Estado de São Paulo e de Mato Grosso, é estimado que cerca de 70% das áreas cultivadas com cana-de-açúcar se encontrem em solos ácidos, com baixa disponibilidade de bases. Nessas condições, estudos concluem que um dos fatores que têm limitado o aumento de produtividade das culturas é o pequeno volume de solo explorado pelo sistema radicular. Ainda considerando estes estudos, constata-se que em solos de baixa fertilidade, o sistema radicular da cana-de-açúcar explora efetivamente cerca de 60cm de solo, embora observações de campo mostrem que a cana é capaz de explorar profundidades de 120 a 200cm, quando não há evidências de barreiras químicas ou mecânicas dificultando o crescimento das raízes. Resultados experimentais têm demonstrado que é possível aumentar a profundidade de penetração de raízes, reduzindo-se essas barreiras através da aplicação de calcário e gesso. Todavia, o uso de gesso isoladamente pode mobilizar uma significativa quantidade de magnésio e permitir a sua lixiviação no perfil do solo. Quando o gesso é misturado ao calcário essa perda parece ser reduzida {Morelli(1992a)} e {Silva(1998a)}.

O ajuste da relação Ca:Mg é mais uma alternativa para o uso de gesso. Em solos com pH 6,5 a 7,0, nos quais a relação Ca:Mg esteja próxima de 1:1 e a correção desta relação seja uma necessidade para a cultura, procura-se com o uso do gesso aumentar o teor de cálcio da solução do solo e dos sítios de troca, sem que o pH seja alterado. Neste caso busca-se uma relação Ca:Mg no solo na faixa de 3:1 a 6:1, onde é melhor o equilíbrio entre estes dois nutrientes. O gesso também é uma opção para o fornecimento de cálcio em situações onde a idéia é manter o pH do solo inalterado, observando os limites em que já se encontrava, após a implantação da cultura ali existente. Este é o caso, principalmente, da cultura de batata que é altamente exigente em cálcio, mas que deve ser cultivada em solos ácidos para evitar o aparecimento de moléstias, tais como a sarna comum e a murcha bacteriana (murchadeira), cuja incidência aumenta quando o pH encontra-se próximo à neutralidade ou alcalino. Segundo a literatura, o gesso é utilizado com sucesso na cultura da batata na Europa {Borkert(1987a)}.

Em razão de suas características de movimentação no solo e em função dos sítios de atuação no complexo de trocas dos solos, o gesso pode apresentar excelentes resultados quando aplicado juntamente com o calcário.

 

3.2. Critério para Recomendação de Gesso

 

Quando se deseja verificar a necessidade do uso gesso, a diagnose para a avaliação das condições do solo deve ser realizada não apenas da camada arável, mas também das camadas subsuperficiais (20 a 40 cm e/ou 30 a 60 cm) dos solos. Ao fazê-la  deve-se considerar as características químicas e texturais  dos solos ali encontrados. Com a finalidade de criar condições que favoreçam o desenvolvimento radicular das plantas, as recomendações para o uso de gesso consideram as condições químicas determinadas para as camadas subsuperficiais.  

Em culturas menos tolerantes à presença de alumínio trocável, a resposta ao gesso poderá acontecer quando as seguintes condições forem observadas ( conforme as sugestões abaixo relacionadas):

1.        saturação por Al na CTC efetiva (m%) maior que 20%, e ou o teor de Ca menor que 0,5 cmolc/dm3  (ou 5 mmolc/dm3) de solo (EMBRAPA-MS/MT).

2.       saturação por Al na CTC efetiva (m%) maior que 30%, e ou o teor de Ca menor que 0,4 cmolc/dm3  (ou 4 mmolc/dm3)  de solo (EMBRAPA). As soluções 1 e 2 consideram diferentes classes de teores de argila no solo para a definição das quantidades de gesso a serem aplicadas.

3.       saturação por Al da CTC efetiva (m%) maior que 40%, ou e o teor de Ca menor que 4 mmolc/dm3 (ou 0,4 cmolc/dm3) e Al maior que 5 mmolc/dm3 (ou 0,5 cmolc/dm3) de solo (BOLETIM TÉC. 100/IAC). Neste caso a quantidade de gesso a ser aplicada será função direta do conteúdo de argila observado no solo.

A aplicação de gesso agrícola pode ser feita a lanço isoladamente ou em mistura com o calcário na mesma época em que se proceder à aplicação do corretivo (calcário), seguindo-se da incorporação com aração e gradagem.

É muito importante o acompanhamento das alterações químicas, provocadas pela ação dos produtos aplicados ao solo. Para isso é recomendado um acompanhamento periódico das condições do solo, utilizando-se análises químicas em amostras de solo coletadas em profundidades específicas, para cada elemento ou condição que se deseja conhecer. No caso do gesso é importante que elas ocorram nas camadas de 20 a 40cm de profundidade, quando a profundidade da primeira camada amostrada for de 0 a 20cm, ou de 30 a 60cm, quando a primeira camada amostrada for de 0 a 30cm. Este acompanhamento tem como finalidade principal avaliar os possíveis desbalanceamentos nutricionais para magnésio e potássio em relação ao teor de cálcio. O efeito residual do gesso, da mesma forma que o do calcário, perdura por vários anos. Este efeito sobre as características dos solos será mais intenso em solos que estejam recebendo a aplicação do insumo pela primeira vez.

 

4. Relação Ca/Mg no solo

 

A calagem, quando aplicada para a correção da acidez do solo, tem por finalidade adicional prioritária fornecer quantidades suficientes de cálcio e magnésio ao solo. Desta forma capacita o solo a suprir adequadamente as necessidades das plantas por estes nutrientes. As quantidades de cálcio são freqüentemente elevadas nestes produtos. Assim, o seu suprimento estará normalmente garantido na medida em que ocorrem as aplicações de calcário. Destarte, as atenções devem então ser dirigidas para o magnésio. A maioria das espécies cultivadas tem as suas necessidades nutricionais supridas quando os teores deste elemento nos solos estiverem acima de 5 mmolc/dm3. Em caso de espécies que necessitem de quantidades mais elevadas de potássio para a satisfação de sua demanda nutricional, recomenda-se que este valor de magnésio no solo fique acima de 9 mmolc/dm3. Este cuidado deve ser tomado em razão da competição existente entre estes dois elementos na absorção pelas plantas. Eles são absorvidos pelas raízes pelos mesmos meios e o excesso de um poderá implicar em sintomas de carência do outro. 

As decisões para a escolha do tipo de calcário a ser aplicado em uma correção de solo, costumam pautar pela proporcionalidade entre os elementos cálcio e magnésio existente no solo. A adoção deste critério leva o operador da recomendação a escolher entre os calcários calcítico e dolomítico, ou magnesiano dependendo comportamento mostrado pelas relações Ca:Mg no solo. Todavia, algumas instituições de pesquisa dão pouca importância para esse indicador de proporcionalidade, preferindo dar maior atenção para os níveis destes elementos no solo. Isto porque, estudos de resultados experimentais, englobando um número expressivo de culturas, mostram que esta relação no solo pode experimentar proporções mais amplas (Ca:Mg = 0,5:1 até 30:1) sem prejuízo para a produtividade, desde que sejam garantidos os teores mínimos no solo para o cálcio e para o magnésio. A cultura do milho parece encaixar-se dentro desse conceito de amplitude de relação Ca:Mg. Mantido o teor de magnésio no solo, em valores acima de 5 mmolc/dm3, a cultura pode ser plantada em locais, cujos solos apresentem relações de Ca:Mg muito superiores àquelas comumente propostas, sem que seja observada nenhuma interferência negativa sobre a produtividade de grãos

Entretanto, quando este critério é eleito como diretriz para recomendações de calagem, procura-se fazer recomendações que visem manter no solo uma relação Ca:Mg de 3:1 a 5:1. Esta tem sido a diretriz tem sido adotada para a cultura da cana-de-açúcar, onde a indicação é que as relações Ca:Mg sejam mantidas do citado intervalo. As ocorrências experimentais mostram que esta premissa não é determinante para o comportamento da produtividade. Num estudo de campo conduzido para a avaliação da influência de calcário e gesso em soqueiras de cana-de-açúcar, num canavial em estágio de 20 corte, na região nordeste do Brasil, as melhores produtividades ocorreram quando a relação Ca:Mg no solo estiveram entre 1,9:1 e 2,5:1, independentemente da quantidade e do tipo de produto aplicada em cada um dos tratamentos Calcar03a{Albino(2002a)}. Duas observações são importantes neste trabalho. A primeira diz respeito ao fato de que o solo do local estudado não havia recebido aplicação de calcário por ocasião do preparo de solo. Em princípio, uma forte razão para se ter obtido resposta para o uso de calcário em um canavial em estágio de soqueira. A segunda é que as relações Ca:Mg observadas apesar de englobarem o intervalo proposto (1,7:1 até 1:6,6), não foi fator decisivo para a produtividade, mostrando resultados insatisfatórios exatamente na parte superior do intervalo observado no experimento.

Em estudo semelhante, porém conduzido em condições controladas em estufa, foram avaliadas diferentes fontes de cálcio (carbonatos, sulfatos e cloretos), utilizando-se como controle plantas de cana-de-açúcar das variedades NA56-79 e CP51-22, plantadas em colunas de PVC. Verificou-se que houve uma alteração significativa nas relações Ca:Mg do solo nos diversos tratamentos testados Calcar04a{DalBó(1986a)}. Observou-se que o volume de raízes produzido pelas plantas foi influenciado negativamente pelas relações Ca:Mg mais elevadas. Contudo, tais alterações não foram suficientes para limitarem a produção de matéria seca da parte aérea das plantas nos diferentes tratamentos avaliados Calcar05a{DalBó(1986b)}.

 

 

SIGA- Métodos e Gestão Agrícola S/C Ltda.

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